A redação do ENEM lacrou ao expor a ferida da não valorização do trabalho da mulher, como cuidadora e gestora familiar. A atriz e estudante de psicologia Ana Terra, na tentativa de mostrar a diferença das atribuições entre homens e mulheres, fez inúmeras entrevistas entre eles. As mulheres responderam que ao chegarem em casa do trabalho faziam o jantar e cuidavam dos filhos e os homens responderam que tomavam banho e assistiam televisão. E essa é infelizmente a realidade da maioria dos lares brasileiros.

Essa cultura surgiu dos séculos passados, quando o homem era o único provedor e a mulher ficava encarregada das atividades domésticas. Só que hoje a realidade é outra, as mulheres entraram no mercado do trabalho para contribuírem com o orçamento doméstico, e os homens, fruto da cultura machista, continuam usufruindo e não contribuindo na divisão das tarefas domésticas, e o que é um dever, passa a ser um favor que alguns homens mais compreensivos prestam as suas companheiras.

E o trabalho feminino se manterá invisível enquanto o Estado, a sociedade, a mídia, não colocarem o tema em debate. A maioria das mulheres não sabe que a divisão das tarefas domésticas e da criação dos filhos é um direito, e não um favor prestado pelo companheiro bonzinho. Estou exagerando? Basta constatar nas reuniões de pais e mestres nas escolas. As mães pedem licença do trabalho e participam ativamente e os pais nunca estão presentes.

A sociedade deve exigir um debate profundo sobre a injustiça praticada contra as mulheres e o debate se tornar público e recorrente. Só assim pode-se transformar a realidade e reconhecer que o trabalho doméstico, pouco valorizado por não ser remunerado, é cansativo, interminável, invisível e depreciado, coisa de mulherzinha. E só se torna visível quando não realizado, em geral porque a mulher adoece exaurida. Parabenizo ao Enem por expor tema tão relevante para ser analisado pelos jovens, pois são eles os atores de transformação da sociedade. E pelas abordagens a respeito das desigualdades raciais, sociais e de gênero. Há motivos para esperançar!