Ainda o medo e a tragédia - Jornal Fato
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Ainda o medo e a tragédia


 

"Já faz bastante tempo que não se passa uma semana sequer sem que tenhamos notícia de acidentes na BR 101. As autoridades, experientes, sabem que, na impossibilidade de apontarem o culpado, podem satisfazer a curiosidade pública repetindo, à exaustão, as prováveis causas: negligência, imprudência e imperícia. E, claro, o alcoolismo. Não duvido da análise de nossos valorosos guardas rodoviários. Mas há um outro fator crucial na origem dos acidentes e que ninguém se lembra de citar: a condição das nossas estradas.

 

Dizem os engenheiros especialistas em trânsito que as rodovias não acompanham a evolução dos automóveis; os carros, hoje, voam, mas nossas estradas esburacadas, estreitas e cheias de curvas exigem direção cada vez mais rasteira. Por tudo isso, e não apenas pelos motivos econômicos tão apregoados, é uma grande conquista a anunciada recuperação da BR 101, com a duplicação dos trechos mais críticos. Resta saber se de fato ela ocorrerá. Afinal, a burocracia e a falta de verbas e de organização política estão aí mesmo, para atravancar o processo. Se não houver mobilização da sociedade, corremos o risco de permanecer condenados ao medo e à tragédia."

 

O trecho aí em cima é um resumo de texto que escrevi em 2004. Mas parece que foi ontem. As obras da BR 101 no sul do estado se arrastam, sem que nenhum quilômetro tenha sido ainda duplicado. Os acidentes continuam acontecendo, pelos mesmos motivos de treze anos atrás. Muitas mortescontabilizadas, ao contrário dos valoresarrecadados com o pedágio e surrupiados pela corrupção, desconhecidos do cidadão comum.

 

Hoje, diferente de antes, já se admite que as condições da rodovia acabam favorecendo a ocorrência de acidentes, como o da semana passada, em Guarapari, em que 23 pessoas morreram. Mas agora, me parece, há outra questão a se discutir: que legislação é essa que permite que uma carreta com 35 multas, inclusive gravíssimas, continue trafegando?Como ela consegue passar pelo licenciamento anual? E, passando, como ela não é recolhida quando flagrada novamente cometendo algum delito na estrada?

 

Para mim, leiga em assuntos legais, parece ser o mesmo que um policial abordar por acaso um assassino condenado e não prendê-lo. Mas a verdade é que não deveria estranhar. Num país em que até mesmo a Constituição é desrespeitada a todo momento pelos mais altos mandatários do país, um codigozinho de trânsito não é nada.  Ou seja, nesta área, como nos demais setores da vida social, o Brasil vai sobrevivendo ao arrepio da lei. Ao cidadão comum só resta tentar se conformar ao medo e a tragédia. 


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