Troco: ao invés de lei que já existe, especialistas defendem orientação - Jornal Fato
Economia

Troco: ao invés de lei que já existe, especialistas defendem orientação

Vereador apresenta projeto, mas já há legislação, que inclusive determina que estabelecimentos comerciais devem devolver troco a mais, caso preço seja picado e não haja moeda de um centavo


- Marcos Leão

A moeda de um centavo sumiu do bolso da população, mas não dos preços. Há tempos existe o questionamento sobre o motivo de os valores dos produtos nunca estarem em preços redondos, sempre em numerais quebrados, com final 9.

Clientes reclamam de lojas que vendem produtos com preço picado e não devolvem um centavo de troco.  

"Eles não dão troco, pegam do cliente". Ou: "Cobram mais caro, comprei algo e deu R$ 9,98, cobraram R$ 10,00", eis alguns dos relatos.

Com a justificativa de que muitos estabelecimentos utilizam a estratégia de precificação, mas nem sempre garantem o troco correto, o vereador cachoeirense Ary Corrêa apresentou, inclusive, um projeto de lei para obrigar comerciantes a dar o troco de um centavo aos clientes quando o valor do produto ou serviço for de R$ 0,99. 

Especialistas, contudo, argumentam que seria mais útil uma campanha de conscientização. Pois lembram que já é obrigatório troco de até um centavo, há muito tempo, embora muita gente não saiba.   

"Acho estranho um projeto de lei neste sentido. É obrigatoriedade de qualquer comércio, de qualquer comerciante dar o troco, nem que seja de um centavo. O Código de Defesa do Consumidor já prevê isso, não só para Cachoeiro, mas para o Brasil inteiro", afirma o advogado Nycholas Muruci de Oliveira. 

"E, caso não tenha, pois hoje em dia dificilmente se vê moeda de um centavo, teria que arredondar o valor para menos, não para mais. Por exemplo, cobrando R$ 1,99, não pode arredondar para R$ 2,00. Tem que diminuir para R$ 1,95 e devolver os cinco centavos", explica Nycholas.

Caso sinta-se lesado, a orientação é para o consumidor procurar o Procon. "Se o comerciante negar a dar troco, tem que abrir reclamação no Procon, mas muitas pessoas não o fazem, por se tratar de valor irrisório", pondera o especialista.   

Advogada também atuante na área, Noemi Nantes Borges reforça: "É direito do consumidor receber o troco na íntegra, cada centavo, e não aceitar balinhas ou doces no lugar de dinheiro".

Ela destaca os artigos 30 e 39 do Código de Defesa do Consumidor: "o cliente não pode ficar em posição de desvantagem ao receber seu troco. O estabelecimento é obrigado, no caso de não ter a moeda de um centavo ou a soma de dois, três ou quatro centavos, a dar o troco em valor superior a este, com a moeda ou cédula que tiver em caixa".

Noemi observa: "nos deparamos com muita oferta com preço quebrado. R$ 1.99, R$ 2,99? esta estratégia de marketing pode se dar com propaganda enganosa, infringindo outro artigo do Código de Defesa do Consumidor. Temos que sempre ficar atentos a estas estratégias de marketing e exigir o troco sempre que for possível".

A advogada conclui: "exigir o troco correto não é apenas um direito, mas um dever".

 

Bom senso

Por conta da dificuldade de troco, valores picados geram transtornos tanto para os clientes quanto para os comerciantes na hora do pagamento.

Para Carlos Madella, sócio de um armazém na região central de Cachoeiro, é uma questão de bom senso.

 

 

"Já há algum tempo mantemos os preços arredondados. Os consumidores estão bem mais conscientes. Não é porque um produto é vendido a R$ 4,99 que o cliente vai achar que é mais barato do que R$ 5,00", expõe.

O zelador Antônio Mendes, por sua vez, tem o ponto de vista de que é "mais honesto" arredondar. E alerta: "até as moedas de cinco centavos estão sumindo do mercado".   

 

Fora de linha

O Banco Central anunciou em 2004 o fim da fabricação da moeda de um centavo. O motivo: alto custo de produção e baixa circulação.

Entretanto, a moeda ainda possui valor legal e pode ser usada em transações monetárias, mesmo que não seja mais emitida.

 

 

 

Investigação

Como já mencionado pela advogada Noemi Nantes Borges, há estudos que indicam que os estabelecimentos comerciais adotam o anúncio de preços fracionados como estratégia de marketing, induzindo o consumidor a adquiri-lo por um valor aparentemente mais barato, como R$ 1,99 ou R$ 99,99, por exemplo.

Alguns vão mais fundo e sugerem, inclusive, que a não devolução voluntária do troco pode configurar não apenas o delito de apropriação indébita, como também o de lavagem de capitais, pois escapa de tributação.  

 

 

 

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