O Nascimento da Flor - Jornal Fato
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O Nascimento da Flor

É assim no nosso dia-a-dia. As coisas vão acontecendo devagar, devagar


É impressionante como as coisas acontecem na nossa cara e a gente só as observa quando já estão prontas e acabadas. É assim no nosso dia-a-dia. As coisas vão acontecendo devagar, devagar; ontem um detalhezinho, hoje outro, amanhã mais um e a gente nada de perceber. Quando percebe já está feito e nada mais resta do que admirar e se arrepender de ter perdido o que a natureza nos proporcionou naqueles dias todos. Que passou por nós e nós nem aí.

É isso mesmo; estou falando da natureza. E estou falando da primavera, que teima em não seguir esses calendários que, ano a ano, são distribuídos, com suas propagandas coloridas. Já observaram que em 21 de setembro não acontece nada, a não ser comemorações de uma ou outra camada de gente mais ou menos engajada na luta pela natureza?

Nunca vi, por exemplo, flores desabrocharem no dia 21, nem mesmo em qualquer outro dia de setembro. O que sempre vi, é lá pelo início de novembro, quando levanto os olhos para os morros e me deparo com aquela imensidão de árvores coloridas de amarelos e vermelhos de todos os matizes. É uma festa. Sempre perdi o começo dela. Sempre as encontrei carregadas de flores e delas não desfrutei o prazer de vê-las nascendo e florindo, nem que fosse à distância... não tenho andado subindo morros.

Mas esse ano foi diferente. Começou que uma acácia, aqui em frente, sempre me dava notícias de tristeza; ia perdendo as folhas às centenas e um dia descobria que estava inteiramente nua. Sempre pensei: - "Dessa vez ela morre, a coitadinha". É aquela velha lição de biologia ginasial: de que é através das folhas que as árvores transpiram. Quando perdem esses pulmões, certamente morrem, sem ar, sempre deduzi. (Devo ter aprendido errado a lição - por mais que isso se repita, a árvore, ainda bem que não morre).

A acácia ainda não deu flores. Este ano eu já sei que ela não vai morrer. Mais uma vez vai florir amarelo, e será linda com sempre foi durante todos os anos que eu a vi florida, como foram em todos os anos anteriores, que não vi.

Não mais serei surpreendido. Dia após dia observo "minha árvore" e todas as demais, ao longe, nos morros. Observo uma lá em cima, que já está dando flores. A cada dia mais flores nascem. São vermelhas aquelas.

Importa é que este ano fiquei esperto (queria dizer sábio, mas deixa para lá) e estou vendo a natureza florir, desobediente ao calendário. As flores já aparecem e este ano, para mim, muito mais bonitas, pois as vejo nascer, acompanho seu crescimento e estou com ela no momento zero de sua vida.

Pode até parecer bobagem. Meus leitores podem estranhar esse novo estilo meu de escrever, fugindo daquela velha mania de levantar problemas e achar que a solução para Cachoeiro é dessa maneira, ou daquela e outras coisas mais.

Pode parecer bobagem, mas hoje estou feliz como poucas vezes estive. Por isso que saiu esta homenagem ao nascimento de uma flor, de uma vida que começa no ano zero.

(Em algum momento, há mais de 20 anos, escrevi esta crônica, mas não sei quando. Republico-a, no pensamento de que ela é das primeiras que escrevi. Há diferença entre crônica e artigo; qualquer dia falo sobre isso).

 

Fahrenheit 451

Ray Bradbury

Primeiro e mais importante, escrever nos faz lembrar de que estamos vivos e de que isso é uma dádiva e um privilégio, não um direito... Em segundo lugar, escrever é sobreviver. Qualquer arte, qualquer bom trabalho naturalmente é isso. Não escrever, para muitos de nós, é morrer. Devemos pegar nossas armas a cada dia e todos os dias, talvez sabendo que, se a batalha não pode ser completamente ganha, devemos lutar ainda que desferindo golpes leves. O menor esforço para ganhar significa, ao final de cada dia, uma espécie de vitória... Se você não escrever diariamente, os venenos se acumularão e você começara a morrer, ou a enlouquecer, ou ambos.

É preciso se embriagar da escrita para que a realidade não o destrua... Nas minhas jornadas, aprendi que fico ansioso se passo um dia sem escrever. Dois dias, começo a tremer. Três, suspeito de demência. Quatro, sou um porco chafurdado na lama. Uma hora de escrita é como um tônico...

Toda a manhã, pulo da cama e piso num campo minado. O campo minado sou eu. Depois da explosão, passo o resto do dia juntando os pedaços. Agora é a sua vez. Pule!

 ... Apenas isso: se você está escrevendo sem entusiasmo, sem prazer, sem amor, sem alegria, você é apenas meio autor... não está sendo você mesmo. Talvez nem ao menos se conheça. A primeira coisa que um escritor deve ser é animado. Deve ser uma coisa de febres e entusiasmos. Sem esse vigor, seria melhor ele colher pêssegos ou cavar buracos; Deus sabe que isso seria melhor para a sua saúde.

(Ray Bradbury é especial escritor de ficção científica. Autor da obra-prima da ficção científica - Fahrenheit 451 - que virou filme e descreve tempo futuro em que era proibido ler livros - eram queimados; papel queima a 451º Fahrenheit. O texto reproduzido é do prefácio de seu livro "O Zen e a Arte da Escrita")

 

A ASCOMIRIM PRECISA DE AJUDA

Fins de março, um incêndio destruiu instalações da ASCOMIRIM, sociedade de pessoas simples que recolhe materiais descartáveis específicos para reciclar, vender o reciclado, limpar a natureza e ganhar uns trocados - poucos - para se manter e manter a vida de seus familiares. A ASCOMIRIM fica no antigo morro do lixo, saída para Vitória, Bairro Cel. Borges.

Em Atílio Vivacqua, além de excelente e extenso trabalho que a administração municipal vem fazendo, na recuperação de florestas e de nascentes de córrego, soube, agora, que a Prefeitura está em fase final de investimento em imóvel público, no qual o lixo daquele município será reciclado, por associação semelhante à ASCOMIRIM. Ou seja, a coisa já vai funcionar lá.

Já em Cachoeiro, o silêncio da Prefeitura quanto à recuperação do imóvel da ASCOMIRIM, continua, inobstante compromisso escrito da Prefeitura com o Ministério Público, em TAC - Termo de Ajustamento de Conduta. Quando se fala em TAC, significa que algo está errado. Pouco importa qual administração fez o "malfeito"; o TAC haverá de ser cumprido na atual administração.

Para registro, em 29 de março o Diário Oficial de Cachoeiro informou: - "Coleta seletiva é suspensa devido a incêndio na Ascomirim -... O serviço de coleta seletiva em Cachoeiro... terá de ficar, temporariamente, suspenso. O motivo é o incêndio que danificou o galpão da sede da Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis de Cachoeiro (Ascomirim), no B. Coronel Borges, na terça-feira (26). No local, são recebidos e tratados, para reciclagem, os materiais reaproveitáveis recolhidos no município... Ainda não podemos definir um prazo para o retorno das atividades na sede da Ascomirim... Durante a suspensão, os moradores tentem guardar o material reciclável em casa...".   (Três meses depois e... nada).


Higner Mansur Advogado, guardião da cultura cachoeirense e, atamente, vereador

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