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Santo remédio

Das vantagens que ficar mais velha concedem


Das vantagens que ficar mais velha concedem, a que eu prefiro é de não ir mais aos lugares onde eu não estou com vontade. Já aceitei inúmeros convites quando era mais jovem porque eu achava mesmo que aproveitar a vida era estar em todos os lugares e festas nas quais eu desse conta de ir. E depois, quando tomei consciência de que não era bem assim, ia por causa da impossibilidade física e psicológica que eu tinha de dizer não. Ainda tenho alguma dificuldade com o não, mas já consigo inventar algumas desculpas ou dizer apenas que estou cansada, o que é quase sempre verdade.

Embora na semana retrasada eu tenha ido a uma festa infantil que foi muito bacana, geralmente é um programa que não gosto de fazer. Festas de crianças estão sempre cheias de um exagerado agito dos pequenos, por questões naturais alimentados pelo excesso de açúcar. Isso é combinado com as músicas que são quase sempre as mesmas de quando a criança era eu e que, já naquela época, eu não curtia, e baldes de refrigerante e comidinhas que eu não devo consumir em grande quantidade. Tirando os meus sobrinhos e um ou outro amigo especial, não vou. 

Também não curto mais a casa cheia de "amigos". Cozinhar e receber as pessoas no meu lar é uma coisa que curto demais. Mas não qualquer um. Não o amigo de um amigo. Não alguém cuja presença me incomode. A casa da gente é um lugar especial demais e as boas vibrações que procuramos manter não podem ser degradadas pelos que não são tão queridos. Pelos que não estão na mesma sintonia do bem. Prefiro manter uma certa distância dos mentirosos, dos contadores de vantagens e, principalmente, dos que só conseguem se divertir falando da vida alheia. Muitos serão até bem recebidos, mas com certeza bem poucos serão convidados.

E por falar em bem recebidos, espero, no mínimo, reciprocidade. Ninguém precisa estender tapete vermelho ou fazer cafés da manhã de hotel cinco estrelas e nem jantares mirabolantes para que eu me sinta bem. Um copo de água gelada ou um café já são, para mim, uma excelente recepção. Podem servir dobradinha, que eu adoro. Pode ser pela égua, língua, miúdos, polenta ou nada. Nada é necessário, muito menos requinte. Preciso apenas sentir que minha presença ali não é um incômodo. Preciso sentir que o anfitrião não esteja fazendo força para me aturar. Se existe a mínima desconfiança de que minha presença causa embaraço, mal-estar ou constrangimento, nem penso na possibilidade de ir.

E por aí vai uma lista que cresce à medida que envelheço. Aquelas casas de carnaval lotadas de pessoas que compartilham o mesmo banheiro já não dão mais para mim. Nem camping e nem eventos onde preciso ficar em uma fila enorme para conseguir fazer um prato. Sigo envelhecendo na proporção que fico chata e mais sincera comigo mesma. Em compensação, a enxaqueca deixou de ser minha fiel companheira. Por isso mesmo, recomendo. Faça o que te faz bem. É um santo remédio.


Paula Garruth Colunista

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