'La Casa de Papel': daria para invadir a Casa da Moeda?
Na série da Netflix, criminosos invadem uma Casa da Moeda para imprimir seu próprio dinheiro. Será que essa ideia poderia ser algo mais do que mera ficção?
Dinheiro não nasce em árvore. Nasce dentro de um prédio, com cofres gigantescos, impressoras de ultraprecisão e toneladas de papel. Centenas de pessoas supervisionam sua produção. Tentar entrar em uma casa dessas para imprimir seu próprio dinheiro é coisa de lunático. De nove lunáticos, para ser exato - personagens do seriado espanhol La Casa de Papel, um dos maiores sucessos da Netflix, cuja segunda temporada estreia no dia 6 de abril. Na trama, um grupo de assaltantes forja um cinematográfico assalto à Casa da Moeda espanhola e mantém 67 reféns lá dentro - tudo para enrolar a polícia pelo maior tempo possível e conseguir imprimir 2,4 bilhões de euros ao longo de 11 dias. A ideia, dizem os bandidos, é "não roubar o dinheiro de ninguém", mas imprimir tudo a partir do zero. O seriado é inteiro caricato - os ladrões usam codinomes e se fantasiam com macacões vermelhos e máscaras do pintor Salvador Dalí -, mas não dá para assisti-lo sem se perguntar: um golpe desses é realmente possível? Daria para fazer o mesmo na Casa da Moeda brasileira?
A resposta curta e grossa é "não". Mas a hipótese não deixa de ser interessante. O real é impresso na Casa da Moeda do Brasil, fundada em 1694 pelo rei Dom Pedro 2º de Portugal (não confundir com o nosso Dom Pedro 2º, o último e barbudo imperador do Brasil). A primeira sede foi Salvador e a atual é Brasília - mas o dinheiro mesmo é impresso no Rio de Janeiro, em um complexo industrial imenso, no bairro de Santa Cruz. Ali funcionam três fábricas, que produzem as notas e moedas do real e também diplomas, selos e passaporte com chip eletrônico. A nossa Casa da Moeda é uma das maiores do mundo, e prestamos serviços para outros países: imprimimos cédulas para a Argentina, o Paraguai e a Venezuela, e cunhamos moedas para Angola, Costa Rica, Paraguai e Uruguai. Até o fim de 2018, a empresa estatal deve ser vendida à iniciativa privada - um dos 57 projetos de privatização e concessão apresentados pelo governo Temer.
Entrar na Casa da Moeda carioca seria o primeiro desafio para nossos lunáticos ladrões. Ao contrário do prédio da série, que tem cara de biblioteca pública, o nosso parece uma prisão. De verdade. Por fora, é indiscernível de uma penitenciária: o local é cercado por grades altas e torres de vigilância em cada ponta. No perímetro externo, é vigiado por homens armados do Exército e do Corpo de Fuzileiros Navais. Por dentro, funciona um sistema de bloqueio e controle de acesso de funcionários, e um circuito interno de câmeras que controla todo movimento no parque fabril.
O custo de impressão de uma nota de R$ 100 é de R$ 0,29.
No seriado, a trupe criminosa entra na Casa da Moeda como visitante, para depois sacar as armas e render os seguranças. Por aqui, alguém que queira visitar a fábrica precisa se inscrever previamente e passar por uma pesquisa de antecedentes. Qualquer condenação criminal na ficha, ainda que em primeira instância, ou mesmo que a pessoa esteja em liberdade condicional, proíbe a entrada. Essa medida, por exemplo, já eliminaria os oito criminosos da ficção (a exceção seria o "professor") . "O roteiro do seriado é totalmente inverossímil. Além disso, os equipamentos mostrados são impressoras rotativas, típicas de gráficas comerciais, portanto não possuem a complexidade necessária para a produção real de cédulas", diz a nossa Casa da Moeda. De fato, as cenas das impressões não puderam contar com máquinas reais, por motivos óbvios. A alternativa foi filmar na gráfica do jornal ABC, da Espanha, em papel-jornal mesmo.