Conexão Mansur: Umberto Eco me "salvou" - Jornal Fato
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Conexão Mansur: Umberto Eco me "salvou"

A maioria dos meus livros eu não li. Essa falta de leitura, de algum tempo para cá, passou a me incomodar


- Ilustração: Zé Ricardo

Como é (acho) do conhecimento relativamente geral dos meus amigos e conhecidos, tenho, em casa, quantidade imensa de livros, os quais transbordam das muitas estantes e se espalham por toda a minha casa.

Sou comprador de livros desde 1961, pelo menos. Nesse ano adquiri - e ainda está em minha estante, com dedicatória - o livro de Fernando Ferrari, então candidato a Vice-Presidente da República, e devidamente autografado. É o "Mensagem Renovadora", que trazia (e traz) o que ele pretendia fazer se eleito... (Tinha eu 12 anos, quando adquiri o livro, adquirido com dinheiro de meu pai Manoel Mansur, lá no município do Alegre).

Nos últimos 62 anos, de 1961 pra cá, minhas estantes só foram enchendo e muitos deles foram lidos, embora deva confessar - a maioria eu não li. Essa falta de leitura, de algum tempo para cá, passou a me incomodar, ao contrário do passado, onde me alegrava (e alegra, ainda), correr os olhos pelas estantes.

O incômodo, apesar de há muito tempo eu ser doador de livros para amigos, estudantes e bibliotecas públicas, vinha do fato da não leitura de boa parte deles, o que não seria um "negócio legal", passei a entender. A dor era menor um pouco, vez que minhas doações de livros cresceram bem... mas ainda tenho muitos livros não lidos.

A dor quase acabou, vez que diminuiu sensivelmente, em função das doações que faço. Agora acabou de verdade a partir de leitura que fiz no facebook, de texto postado por Erivaldo Kassapa, referente a um grande autor de livros e gente da maior qualidade - Umberto Eco.

Diz o texto postado pelo Erivaldo: - "Umberto Eco, dono de 50.000 livros, tinha isto a dizer sobre bibliotecas domésticas: - "É tolice pensar que tem de ler todos os livros que compra, pois é tolice criticar aqueles que compram mais livros do que alguma vez conseguiram ler. Seria como dizer que deve usar todos os talheres ou óculos ou chaves de fenda ou brocas que comprou antes de comprar novos. Tem coisas na vida que precisamos ter sempre abundância, mesmo que usemos apenas uma pequena porção.

Se, por exemplo, consideramos os livros como medicina, entendemos que é bom ter muitos em casa em vez de alguns: quando se quer sentir melhor, então vai ao 'armário dos remédios' e escolhe um livro. Não um aleatório, mas o livro certo para aquele momento. É por isso que você deve ter sempre uma escolha nutricional!

Quem compra apenas um livro, lê apenas esse e depois se livra dele. Eles simplesmente aplicam a mentalidade do consumidor aos livros, isto é, consideram-nos um produto de consumo, um bem. Quem ama livros sabe que um livro é tudo menos uma mercadoria."

Pronto, o amigo e Umberto Eco, de quem sou fã definitivo, curaram minha dor, sem contar que estou esperando a transferência da Biblioteca da Prefeitura de Cachoeiro para a antiga Escola Bernardino Monteiro, em reforma.

Quando a reforma estiver concluída (está demorando) vou lá verificar se os livros efetivamente ficarão em áreas não inundáveis. De início, são 120 livros de música, de minha propriedade, já separados para doação. Breve separarei os sobre a Invasão Holandesa, sobre o Nazismo, sobre Padre Vieira, sobre a Idade Média, sobre o Renascimento e livros regionais históricos, etc. etc. e mais etc.

 

Umberto Eco Escreveu

(Frases do livro de Umberto Eco: "Pós-Escrito a O NOME DA ROSA)".

- Os grandes de outrora, as cidades famosas, as belas princesas, tudo se esvai no nada...

- Um narrador não deve oferecer interpretações de sua obra, caso contrário não teria escrito um romance.

- Talvez fosse preciso ser honestamente desonesto como Dumas, porque é claro que OS TRÊS MOSQUETEIROS, na verdade, é a história do quarto.

- A ideia de O NOME DA ROSA veio-me quase por acaso e agradou-me porque a rosa é uma figura simbólica, tão densa de significados que quase não tem mais nenhum.

- Nada consola mais o autor de um romance do que descobrir nele leituras nas quais não pensava e que os leitores lhe sugerem.

- O autor deveria morrer depois de escrever. Para não perturbar o caminho do texto.

- Uma criança fala muito bem a língua materna, mas não saberia escrever a sua respectiva gramática. Mas o gramático não é o único que conhece as regras da língua, porque estas, sem saber, a criança conhece muito bem: o gramático é apenas aquele que sabe como e por que a criança conhece a língua.

- Escrevi um romance porque me deu vontade. Creio que seja uma razão suficiente para alguém pôr-se a narrar. O homem é um animal fabulador por natureza. Comecei a escrever em março de 1978, movido por uma ideia seminal. Eu tinha vontade de envenenar um monge.

- Só conheço o presente através da televisão, ao passo que da Idade Média tenho um conhecimento direto.

- Na verdade, não decidi apenas contar sobre a Idade Média. Decidi contar na Idade Média, e pela boca de um cronista da época.

- Os livros falam sempre de outros livros e toda história conta uma história já contada.

- Existe um provérbio indiano que diz "senta-te à beira do rio e espera, o cadáver de teu inimigo não tardará a passar".

- É preciso criar obstáculos, para poder inventar livremente.

- Escreve-se pensando em um leitor, assim como o pintor pinta pensando no observador do quadro. Depois de uma pincelada, recua dois ou três passos e estudo o efeito: isto é, olha o quadro como deveria olhá-lo o espectador, ao admirá-lo pendurado na parede, em condições de luz adequadas. Quando a obra está terminada, instaura-se um diálogo entre o texto e os seus leitores (o autor fica excluído). Enquanto a obra está sendo feita o diálogo é duplo.

- Eu, grande admirador da poética aristotélica, sempre pensei que, apesar de tudo, um romance deve divertir também e sobretudo através da intriga.

- Desconfio que devamos talvez renunciar àquela ideia subjacente que domina constantemente nossas discussões e segundo a qual o escândalo público deveria ser uma prova da validade de um trabalho.

- Existe sempre quem tome o discurso irônico como se fosse sério.

- Cada um tem uma ideia própria, geralmente deturpada, da Idade Média. Só nós, monges daquela época, sabemos a verdade, mas ao dizê-la, podemos ser queimados vivos.


 

PÓS-ESCRITO A "O NOME DA ROSA"

A imagem que reproduzo nesta página é a contracapa do livro de Umberto Eco, de onde tirei as frases que preenchem esta Conexão. O brilhantismo de Umberto Eco invade até a contracapa de seu livro.

 


Higner Mansur Advogado, guardião da cultura cachoeirense e, atamente, vereador

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