O vento e o mar - Jornal Fato
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O vento e o mar

O vermelho-alaranjado parece brotar do fundo do mar em ascensão aos céus, como se o universo acabasse onde nossa visão alcança


- Foto Reprodução Web

Dias atrás acompanhei o nascer de um dia em Cachoeiro de Itapemirim. Observei os montes enfileirados que rodeiam nossa cidade com destaque para o Pico do Itabira e o Frade e a Freira. De Cachoeiro carrego comigo o hábito de levantar-me antes da alvorada, e assim, da sacada do apartamento observo o município canela verde capixaba. Vila Velha, se mostra: à esquerda, bem no alto e ao longe, o Convento da Penha; no centro: o Morro do Moreno e à minha direita: o mar. Do Convento vem a lembrança da Romaria dos Homens, uma obrigação que minha mãe, devota de Nossa Senhora da Penha, me fazia cumprir na adolescência. Uma caminhada de Vitória (bairro Santo Antônio) ao centro da cidade vizinha. Hoje, com a obrigação cumprida, a santa, em recompensa, parece me dizer: calma, não se deixe tomar pela ansiedade, as coisas acontecerão. Siga sua consciência. No Morro do Moreno, com a ansiedade domada, vejo com tristeza a diminuição da Mata Atlântica. Lembro que em outros montes o degelo acontece. No Andes, nos Alpes e até no Himalaia. É a natureza sendo agredida e esquecida. Mas, vem o mar e suas duas pequenas ilhas. Nas ilhas, por estarem tão perto, é possível ver seus pequenos habitantes, ainda descansando, o vôo dos pássaros fica para mais tarde. Aguardam o aparecimento do sol. O nascer do sol nas praias de Vila Velha (Itaparica, Itapuã e da Costa), as mais belas praias urbanas capixabas, torna-se algo aliviador e alvissareiro. O vermelho-alaranjado parece brotar do fundo do mar em ascensão aos céus, como se o universo acabasse onde nossa visão alcança, anuncia um tempo diferente para aqueles que assistem seu desabrochar.

Com o sol, e sua luz, rapidamente procuro a areia da praia e o mar. Não me atrevo a enfrentar suas ondas, o mar encontrava-se revolto. Bastava observá-lo, não era preciso desafiá-lo. Recuo, o suficiente para um leve toque da planta dos meus pés nas areias finas e claras que logo recebem as águas geladas do mar de Itapuã. No frio de suas águas em meus pés desperto um calor humano represado nas memórias. Desperto minhas reminiscências. Sigo o vento, lentamente ele me impulsiona. Nas lembranças, e com o vento, caminho em direção as luzes dos navios que se encontram no outro extremo. Pelo caminho, ainda solitário, busco a razão de tão poucas pessoas aproveitarem os instantes de liberdade. Sim, a sensação que tenho ao caminhar pela areia da praia é de estarmos livres. Livres de nossas angústias. Livres das nossas paixões. Uma harmonia de corpo e alma. O pensamento e a visão retornam às ondas do mar. O vento e as tristezas se misturam a inda e vinda das águas e nos devolvem a esperança. Nas ondas do mar, bem no fundo do mar, vejo a Caixa de Pandora, com todas as mazelas do mundo, mas com a esperança depositada em um dos seus cantos.  No alto do Morro, vi o Convento da Penha. No dia claro, com os pássaros brancos sobrevoando as águas azuis; o vento em minha face sussurrava aos meus ouvidos: acredite, é possível.... Quem sabe amanhã. Busque as coisas simples da vida. As coisas simples estão ao alcance de todos.

 


Sergio Damião Médico e cronista

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