Como dois e dois são dez (ou cê tenta de novo) - Jornal Fato
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Como dois e dois são dez (ou cê tenta de novo)

O suingue de Maurice White me é tão vital quanto a ginga de Aldir Blanc


- Fotos: reprodução web e divulgação

Meu fazer literário é fortemente influenciado por Earth, Wind & Fire, a "melhor banda do mundo", conforme anunciava o locutor da Globo, em razão do show do grupo de soul-funk no Maracanãzinho, em 1980.  

O suingue de Maurice White me é tão vital quanto a ginga de Aldir Blanc, xarás de sobrenome, de percussividade e, mais que tudo, de espiritualismo - a pedra ametista do virginiano e a pirâmide egípcia do sagitariano estão, lado a lado, na mesa branca (e fé preta) por meio da qual este fiel os evoca.  

O falsete de Philip Bailey e o groove de Verdine White têm, para mim, a mesma importância que o lirismo de Rubem Braga e a ironia de Ivan Lessa. 

Pois bem. Sabe as curvas dos meus textos, que delineiam a sinuosidade de teu sorriso? Vêm, também, do finge-que-vai-mas-não-vai dos acordes introdutórios de "Let your feelings show".

 

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Não "visto roupa" para anotar - ou falar - poesia. Até nu (seja de ternos ou de convenções), grafo - ou verbalizo - tudo aquilo que minh'alma sente vontade de extravasar. Ou seja, o poeta não sou eu, e, sim, minh'alma.  

O parágrafo acima é fruto de um devaneio matinal que, desocupado de coisas mais importantes, decidiu me acontecer. 

Qual não foi minha surpresa ao me deparar, alvoradas depois, com a seguinte frase, de doutor Tostão, na Folha de São Paulo: "A alma e o corpo andam juntos. O corpo fala primeiro. O corpo é o mensageiro da alma". 

Um mortal jamais espera ser corroborado por uma divindade.

 

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Numa noite de inverno, sonhei que, ao atravessar a Ponte Municipal, um garotinho loiro me abordava e, com um sorriso fino, cintilante e triste, agradecia-me por algo de bom que lhe fiz. "Você ajudou muito a mim, e ainda vai ajudar a muitos outros." 

Perguntei quem era, e ele, em vez de me responder, virou-se de costas (arrombadas com um tremendo tiro de fuzil) e esvaiu-se...

 

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- Está tão quieta por quê, filha?

- Nada não, mãe. Só quero ficar rica.

- Ué? Mas o que uma coisa tem a ver com outra?

- Não dizem que o silêncio vale ouro...

 

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A partir de quarta-feira, as brisas vespertinas voltam a se outonar, levando o cronista a respirar, esperançoso, algo de bom, doce e leve; algo pelo qual, é verdade, tanto fez por merecer, nos últimos outonos.

 

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Escrever é deixar rastros. Propositalmente. É caça que se quer caçada: literatura é consentimento de predação.


Felipe Bezerra Jornalista

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